sexta-feira, 27 de março de 2009

plasticidade -

Teatro -uma arte que constrói novas realidades.



27 de março dia do Teatro mais uma reflexão


Não ir ao teatro é como fazer a toilette sem espelho. Schopenhauer

************************
A ligação entre o que significa ser humano e a prática teatral é tão profunda que a própria palavra teatro vem do grego e significa “local de se ver”, um espaço público onde se podem revelar e discutir as questões essenciais da vida e preparar a pessoa para desenvolver reflexões necessárias para exercer seus direitos e deveres de cidadão.
A própria palavra pessoa vem de “persona”, cujo significado é a máscara grega usada pelo ator.
Não foi por acaso que o teatro grego brotou a partir das festas dionisíacas simultaneamente com a democracia e que precisava de um coro para dar voz aos pensamentos do povo; que os contadores de história do Senegal, os “griots”, eram da casta mais baixa; que a corte francesa ficou provocada a ponto de proibir os atores da Commedia dell’Arte a falar, criando assim a pantomima francesa; que Federico Garcia Lorca foi assassinado pelos fascistas espanhóis, que Bertholt Brecht preferiu o teatro épico; que Augusto Boal foi exilado na época da ditadura. Implícito em cada história sobre o atual está a sua própria prolongação. No teatro, quando se comenta a realidade, pode-se sempre inserir uma visão sobre o futuro. Nesse sentido, teatro,
não é somente uma arte mimética, mas pode ser também uma arte que constrói novas realidades. “O mundo é um palco, e todos os homens e mulheres, meros atores.
Têm suas entradas e suas saídas; Cada pessoa na sua vida representa vários papéis.” Jacques (o alter ego do autor) em Como Quiser, de William Shakespeare
Teatro é uma linguagem universal. Aqui usamos o conceito antropológico de universal, isto é, o ser humano em todas as culturas desenvolveu tradições miméticas de reunir membros de uma comunidade para contar e construir sua história, suas crenças e aspirações e de refletir sobre elas. O conhecimento teatral tem em grande parte um caráter tácito. Uma vez aprendido está na memória corporal, mas é difícil explicitar. Não deve ser, entretanto, confundido com o conceito do não-falável de Wittgenstein (1979).
É possível tanto conhecer como explicar, mas para isso é necessário ultrapassar as convenções acadêmicas e usar métodos participativos e métodos da própria arte cênica. No mundo acadêmico, para combater a tão falada “crise da ciência” convém abrir espaços para arte.

Segundo Aristóteles, o homem precisa tanto do conhecimento teórico (episteme) quanto o prático (techne) para alcançar a sabedoria maior; para que possa, a partir do episteme, agir com ética na realidade (fronesis). (ARISTÓTELES, 1967).
O ator é seu próprio instrumento e como tal necessita ser flexível a ponto de poder se adaptar a várias técnicas. Convém relembrar a divisão em elementos fundamentais do teatro feita por Aristóteles: A fabula, a mimesis e o gestus. Para ele, a história é o elemento principal, mas a ênfase no corpo, no movimento não é novidade.

Renovadores de teatro como Edward Gordon Craig, Jerzy Grotowski, Bertholt Brecht e os artistas de performance atuais focalizam o gestus. Fazem e fizeram isso, muitas vezes inspirados em teatro estilizado oriental, achando que o teatro realista leva o ator moderno para um beco sem saída. O teatro feminista e o teatro queer (que ultrapassa as normas socialmente estabelecidas do que vem a ser comportamento feminino e masculino – o gênero -), também focalizam os gestos, o fazer corporal, porque julgam o processo mimético problemático. A questão fundamental é de quem é a realidade que deve ser espelhada e de que forma isto deve ser feito.
O psicólogo russo Lev Semenovic Vygotsky enfatizou que a arte dramática e a imaginação em geral sempre se baseiam nas experiências de vida da pessoa. Essas experiências são transformadas, deturpadas e montadas de uma forma fantástica para se tornarem ficção, mas sempre com fundamento na realidade.

A atividade criativa é, portanto, circular.

Ela se origina em elementos retirados do cotidiano da pessoa,
do seu meio, processam-se dentro dela e voltam para a realidade com nova força transformadora. Nessa atividade, a capacidade emotiva e a cognitiva são simultaneamente necessárias. Cada processo criativo origina-se num desejo, numa necessidade e a partir de uma imagem.

As obras de arte não são somente fantásticas, são novas realidades, são imaginação cristalizada. (VYGOTSKY, 1995).
Ensinar arte não é somente transmitir técnicas. É também facilitar a ultrapassagem dos obstáculos que limitam a criatividade e procurar métodos para superar barreiras, medos, tabus, convenções e estereótipos. (...)- trecho do trabalho - ANTROPOLOGIA DO TEATRO: A ARTE E A EDUCAÇÃO -Bim de Verdier, mestre em Artes Cênicas -Departamento de Filosofia e Ciências Humanas Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
bim_de_verdier@hotmail.com
&&&&

O teatro é um fenômeno que existe nos espaços do presente e do imaginário, e nos tempos individuais e coletivos que se formam neste espaço

A representação existe desde os tempos primitivos, quando os homens imitavam os animais, para contar aos outros como eles eram e o que faziam, se eram bravos, se atacavam, ou seja, era a necessidade de comunicação entre os homens

O teatro no Brasil surgiu no século XVI, tendo como motivo a propagação da religiosa. Dentre uns poucos autores, destacou-se o padre José de Anchieta, que escreveu alguns autos (antiga composição teatral) que visavam a catequização dos indígenas, bem como a integração entre portugueses, índios e espanhóis. Exemplo disso é o Auto de São Lourenço, escrito em tupi-guarani, português e espanhol.

Ciganinha e o Circo- Vânia Moreira Diniz




Ciganinha e o circo.
Parte I

A pequena Ciganinha acordava muitas vezes com vontade de reinar de verdade. Gostava de ler demasiadamente e escrever, mas precisava acumular histórias e conhecer sempre um mundo novo, diverso, inusitado e profundamente fantástico.
Muitas vezes ela dizia à sua amiguinha
“Quero participar de aventuras e poder depois mostrar para todos!”
Tinha muita vontade de ir à Europa, principalmente à Espanha onde residiam seus antepassados. É certo que já tinha ido, mas há muito tempo com seus avós e aí era apenas um nenê. Gostava também de ir andando, sem rumo e sentar para descansar onde fosse possível se bem que em sua cidade não era fácil. Mas era assim que gostaria de viver.
Nesse dia saiu sem que ninguém percebesse, muito cedo e foi andando desde Copacabana . Levava uma mochila com alguns biscoitos, refrigerantes e água. Estava cansada depois de algum tempo andando, porém sabia que agüentaria muito mais. Foi quando viu um circo, (Ah que alegria, sensação de que chegara ao seu destino), nem deduzia onde era aquele bairro, mas tinha certeza que era afastado da sua casa.
Estava com um vestidinho curto como costumava usar e suas perninhas queimadas em contato ao sol causticante daquele dia. Seu rosto estava rosado e os olhos que mudavam de cor conforme a claridade ou a cor que usava, estavam brilhantes de cansaço e expectativa. Mas não desistiria. Sempre pensou em trabalhar em circo e fazer milhões de malabarismos que costumava aplaudir.
Repentinamente pensou em seus pais e como deviam estar preocupados, mas imaginou que se quisesse uma vida de aventuras eles teriam que se acostumar ao seu modo.
Como o coração batendo muito ela foi entrando e acercou-se daquela espécie de tenda colorida cujo aspecto a fascinava. E entrou.
Tudo parecia silencioso até que viu um homem de jeito bondoso aproximando-se dela e perguntando enquanto a olhava com admiração:
-Linda, linda menina, não estamos em atividade agora...
-Eu não quero ver, quero trabalhar aqui, posso ficar?
A naturalidade com que a garota falou levou o seu interlocutor a sorrir com encantamento...
-Minha querida, onde mora?
Ciganinha não gostava de mentir. Mas sabia que se contasse a verdade o homem não a deixaria ficar...
-Moro na rua... Não tenho casa...
-E seus pais?
-Não conheço...
Mario (assim ele se chamava) olhou-a dizendo que ela era uma menina muita bem tratada e não tinha jeito absolutamente nenhum de morar ao relento. Mas Ciganinha lhe disse que de fato dormia na casa de uma família, mas que precisava trabalhar para ajudá-los.
O homem ficou tão seduzido pela garota, resolveu então lhe dar a oportunidade de um treinamento para atuar no que ela pedia com tanta veemência. Mas fez Ciganinha prometer que durante o dia iria estudar no colégio que ele lhe arranjasse.
A menina transbordou de felicidade e logo se tornou amiga de todos os participantes do circo e jurava que seria uma escritora, mas também começaria sua vida artística por um circo. Nem pensou muito o quanto sua família devia estar aflita! Estava deslumbrada por tudo que via à sua frente.
Em dois dias estava treinando a executar algumas piruetas e apesar da sua inexperiência os assistentes, a platéia enfeitiçada a aplaudia delirantemente...
Ao mesmo tempo uma saudade profunda de seus pais e avós começou a dominá-la, enquanto com a malha que lhe davam para vestir, as perninhas fortes e musculosas e o rosto expressivo conquistava os adultos e crianças que lhe assistiam...
Como seria daí em diante?
E enquanto sempre nos intervalos escrevia sua própria fantasiosa história deixava que o tempo passasse e lhe indicasse um caminho contanto que não lhe tirasse o mistério e a alegria de seus dias atuais...

Texto inserto do Livro Ciganinha de Vânia Moreira Diniz
Homenagem ao Dia do Circo

Meu amor ao Teatro-Vânia Moreira Diniz

Meu Amor ao Teatro
O teatro é a forma de expressão mais perfeita em que o ator expressa a fala do personagem com toda a sua carga de energia., sentimento, de emoção.
No teatro eu me realizava não só indo a peças maravilhosas em que sentia e vivia por cada um dos atores como também recebendo a avalanche emocional que vinha do autor com a intensidade de um furacão.
Desde muito pequena comecei a exercitar e amava subir ao palco e encenar o personagem que me destinavam, nada mais fascinante do que representar outra pessoa com sentimentos diferentes e personalidade variada. Eu me vestia com a capa de alguém que amava, sofria, raciocinava e agia de maneira às vezes e em sua maioria inusitada para mim.
Tudo ali me seduzia a ponto de na temporada que eu encenava, sentir a personagem que eu estava vivendo assim como acontece quando escrevo um livro. Só que escrever é um ato solitário mas intenso e fantástico, enquanto o teatro as luzes ou penumbras, as pessoas que compunham a platéia, o diretor e os outros atores, o diálogo , tudo me fazia explodir em emoção interna a ponto de parecer que eu não era eu mesma. Realmente me transportava inteiramente.
Bem pequenina começou minha alucinação pelo palco como havia acontecido pela escrita. E na minha ignorância infantil imaginava que ninguém saberia transmitir o que o autor escrevia com a mesma força e expressão do que ele mesmo, trazendo na hora certa as inflexões mais enfáticas.
Na verdade acho que quando declamo meu próprio verso ele retorna o que senti na hora que o escrevi, interpretando minha alma e o sentimento que transbordava no momento que o fiz.
E por isso, além de tudo que o teatro sempre representou em luzes, brilho , talento, delírio dos assistentes vibrantes e empolgados, aplausos entusiasmados, ele interpreta a expressão dos autores e a manifestação que metamorfoseia nosso ser individual.
Quando aos 12 anos fui convidada para encenar uma peça num teatro profissional e meus pais me proibiram terminantemente, por um minuto minha alma morreu naquele sonho que consumira tantos dias do meu viver. Já tinha ensaiado a peça sem eles saberem e meu coração ruiu por tê-los enganado e por cair por terra tanta esperança, vibração e alegrias acumuladas.
Alguns anos mais tarde fiz um a temporada no teatro Ginástico português mas tantas eram as obrigações que eu tinham em volta, embora com apenas dezesseis anos que não pude me dedicar inteiramente ao teatro.
O Teatro, no entanto é um desafio que trago dentro de mim enclausurado mas pronto a explodir na hora exata . Um desafio que faz parte da minha missão e não poderei sair daqui, voar para outras galáxias ou abandonar essa parte da viagem sem executá-la, e ao final, olhos fechados ouvir a música final que faz parte do sonho que realizarei absorvida nessa fascinação que sempre me envolveu..
Vânia Moreira Diniz
Homenagem ao Dia do Teatro